quinta-feira, 22 de dezembro de 2011

Liberdade de expressão e apologia ao crime: uma questão de semântica ou de opinião?

Por Rubens Teixeira*
A liberdade de expressão fundamenta-se basicamente no direito de manifestar livremente opiniões. É um direito tão mais valorizado quanto mais consolidada é uma democracia. O fato de ser valioso e importante este direito, não o torna ilimitado. É como a liberdade, por exemplo: sempre há um limite legal ou moral.
Com base nestes fundamentos de limites, o legislador estabeleceu uma delimitação bastante significativa, longe de ser instituída apenas por questões morais. Tal marco foi por ele denominado: apologia de crime, conforme Art. 287 do Código Penal: “Fazer, publicamente, apologia de fato criminoso ou de autor de crime”. É uma restrição estabelecida pelo legislador, como é o sinal de trânsito ao direito de ir e vir ou conforme a pena de morte no Brasil, em tempo de guerra, um limite ao direito à vida, enfim. São limitações propositais por quem tem o direito e o dever de legislar em nome do povo.
Portanto, tudo o que é crime ou criminoso não pode ser objeto de apologia: nem os mais ou menos graves, tampouco os praticados por pessoas mais ricas ou mais pobres. Essa definição se aplica, ou deveria se aplicar, a qualquer crime. Por exemplo, não se pode fazer apologia a estupros ou a estupradores, a homicídios ou a homicidas, a pedofilia ou a pedófilos, ao tráfico ou a traficantes, sequer ao uso de drogas ou a drogados.
A autorização para se realizar a marcha da maconha interessa especialmente aos demandantes por drogas. Como não há mercado que funcione bem sem oferta e demanda, os interessados em ofertar as drogas poderão, em tese, requerer tratamento idêntico, alegando que a defesa do tráfico de drogas poderia ser feita no campo das ideias. Partindo do pressuposto que os traficantes tem maior capacidade de mobilização, se fosse dado tratamento isonômico aos interessados, tanto na oferta como na demanda de drogas, certamente os traficantes teriam um poder de mobilização maior que os usuários.
Conforme dados da Fundação Getúlio Vargas, os usuários de drogas se concentram em mais de 70% nas classes A e B, levando a crer que os maiores beneficiários com a marcha da maconha sejam pessoas de maior poder aquisitivo. Ademais, para manter esta infraestrututa que permite a droga chegar aos demandantes, maciçamente ricos, morrem muitos pobres – alguns dos quais jamais tiveram oportunidades em educação, saúde e respeito mínimo da sociedade.
Se esta leitura estiver errada, resta somente a alternativa de entender que a marcha da maconha seja fomentada por usuários ricos e escalões elevados do tráfico de drogas, também ricos, em uma composição para trazer à legalidade uma mercadoria que só interessaria ao setor econômico que exploraria o mercado da droga, sem necessariamente eliminar a existência do tráfico de entorpecentes, uma vez que outras mercadorias de comércio legalizado, como eletroeletrônicos, são também objetos do mercado ilegal.
Aos usuários restará, portanto, os efeitos danosos à saúde, e ao Estado, a responsabilidade de tentar recuperar os atingidos pelos efeitos das substâncias químicas nocivas ao organismo humano.
Não me parece que a língua portuguesa seja um limitante para o entendimento de legisladores e juristas do que se quer dizer e do que se entende da lei. O “Espírito da Lei” não pode ser tão emocional que fira a razão e contrarie o sentido das palavras expressas no texto legal. Princípios, sejam eles quais forem, não podem ser atalhos para entendimentos minoritários da lei, contrários à prescrição legal que firam fundamentos da democracia, especialmente o mandamento constitucional de que todo o poder emana do povo, diretamente ou por meio de representantes eleitos. Esse mandamento pode até desagradar, mas dá apenas às Casas Legislativas o poder de se elaborar leis. Só a elas. É a salutar tripartição de poderes, secularmente defendida.
O tema em debate e definido na lei não pode ser tão transcendental que as palavras estabelecidas por mortais legisladores e cidadãos não sejam compreendidas por um entendedor que seria tão mais sábio em entender do que o legislador em legislar. O julgador não pode deliberadamente desprezar a semântica por conta de sua opinião, contrária à vontade do povo. O legislador, ao aprovar um texto legal, dá um comando a ser cumprido por todos. Ele é o emissor do mandamento em nome da sociedade. Todos são receptores. Tal conceito de transmissão e recepção de ideia não pode estar invertido a ponto de o emissor não ser o responsável de se fazer claro no que pretende, levando o receptor a entender contrariamente o teor da mensagem transmitida. Não há marionetes nesse sistema de emissão e recepção de mensagens. O emissor e o receptor são autônomos. Um que tente subjugar o outro estará enfraquecendo a democracia, tornando frágeis os mais valiosos pressupostos da divisão de poderes.
Um país conhecido pela unidade idiomática, como o Brasil, não pode ter sua democracia combalida por conta de entendimentos transcendentais do que seria correto. O texto em tela é tão claro que até os de educação mais modesta entendem-no.
Semanticamente e juridicamente, fazer apologia ao uso de drogas tipificadas como crimes, homicídio, tráfico, estupro, pedofilia et cetera é crime, ainda que, por questões de opinião, política ou judicialmente não seja.
Assista ainda o vídeo com entrevista em que falei sobre o tema (também em inglês):
[youtube=http://www.youtube.com/watch?v=94AFRZMWSpo]
* Rubens Teixeira é formado em Direito(UFRJ), doutor em economia(UFF), mestre em engenharia nuclear(IME) e engenheiro civil(IME).

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